segunda-feira, 7 de maio de 2007


Para que possamos falar do Ultra-Romantismo, precisamos primeiro entender seu estilo maior, o Romantismo. A principal característica do Romantismo em seus três períodos é o sentimentalismo; a supervalorização das emoções pessoais: nesse estilo é o interior humano que conta, o subjetivismo. À medida que a busca dos valores pessoais se intensifica (como o culto do individualismo), perde-se a consciência do coletivo social. A excessiva valorização do "eu" gera o egocentrismo: o ego como centro do universo. Evidentemente, surge aí um choque entre a realidade objetiva e o mundo interior do poeta. A derrota inevitável do ego produz um estado de frustração e tédio, que conduz à evasão romântica. Seguem-se constantes e múltiplas fugas da realidade: o álcool, o ópio, os prostíbulos, a saudade da infância, as constantes idealizações da sociedade, do amor, da mulher. O romântico foge no tempo e no espaço. No entanto, essas fugas têm ida e volta, exceção feita à maior de todas as fugas românticas: a morte.

Houve uma sensível mudança no comportamento dos autores românticos: há algumas semelhanças entre os autores de um mesmo período, mas a comparação entre os primeiros e os últimos representantes, revela profundas diferenças. No Brasil, por exemplo, há uma distância considerável entre a poesia de Gonçalves Dias (primeira geração - Indianista ou Nacionalista), de Álvares de Azevedo (segunda geração - Ultra-Romantismo) e de Castro Alves (terceira geração - Condoreira). Por isso há a necessidade de se dividir o Romantismo em gerações.

A Segunda Geração da Poesia Romântica

"No Brasil, ultra-românticos foram os poetas-estudantes, quase todos falecidos na segunda adolescência, membros de rodas boêmias, dilacerados entre um erotismo lânguido e o sarcasmo obsceno. Os que dobraram a casa dos vinte e cinco acumularam os fracassos profissionais e os rasgos de instabilidade, confirmando a índole desajustada desses 'poetas da dúvida', a que faltam por completo a afirmatividade dos românticos indianistas e a combatividade dos condoreiros."

(José Guilherme Merquior)

Esta segunda geração da poesia romântica brasileira é marcada pela falência dos ideais nacionalistas utópicos dos nossos primeiros românticos. A oclusão do sujeito em si próprio é detectável por um fenômeno bem conhecido: o devaneio, o erotismo difuso e obsessivo, a melancolia, o tédio, o namoro com a imagem da morte na figura feminina, a depressão, a auto-ironia masoquista: desfigurações de um desejo de viver que não almejou sair do labirinto onde se aliena o jovem crescido e em fase de estagnação.

Enquanto o homem busca um espaço social, muitas vezes iludido quanto às possibilidades concretas de atingi-lo, o ultra-romântico afasta-se; opta pela fantasia ao invés da realidade, entrega-se aos seus próprios fantasmas, oculta-se do mundo passando a ser ele mesmo o seu mundo. Assim o poeta sente-se liberto dos condicionamentos e feridas ao tentar adaptar-se. Entretanto, esta atitude o escraviza quando levado ao extremo: negar a vida conduz ao delírio da morte, ao excessivo egocentrismo, à nostalgia de um passado medieval, desta vez idealizado, mais nobre, menos embrutecedor. Segue-se as ilusões deste passado, o seu culto, do qual resultam mais demônios do que anjos. O poeta consumido por suas próprias idéias, torna-se "fantasma" ao invés de "eleito", transforma-se em "suicida vitimado" pela necessidade de uma vida melhor, uma vida maior, que, no entanto, não consegue conquistar.

O chamado "mal-do-século" foi difundido no Ultra-Romantismo. Cultivado na Universidade do Largo São Francisco, retrata reuniões regadas a vinho e éter geralmente em repúblicas e cemitérios.

Influenciado pelas obras de Lord Byron, Álvares de Azevedo foi o maior representante da Segunda Geração Romântica. Sua prosa apresenta o noturno, o aventuresco, o macabro, o satânico, o incestuoso, os elementos do romantismo maldito. Abrangem o amor e a morte sob uma perspectiva exacerbadamente egocêntrica.

Ao lado de Álvares de Azevedo, três outros autores destacam-se na segunda geração da poesia romântica brasileira: Casimiro de Abreu, Fagundes Varela e Junqueira Freire. As obras literárias de cada poeta e de seus períodos respectivos, apresentam entre si uma característica comum: o medo de amar. Esse temor é, em essência, o medo de macular a virgem, de entregar-se ao prazer carnal e, assim, destruir o próprio amor que, na visão deles, passa a ser sinônimo de impureza e pecado.

Características gerais do Ultra-Romantismo

  • liberdade criadora (o conteúdo é mais importante que a forma; são comuns deslizes gramaticais);
  • versificação livre;
  • dúvida, dualismo;
  • tédio constante, morbidez, sofrimento, pessimismo, negativismo, satanismo, masoquismo, cinismo, autodestruição;
  • fuga da realidade para o mundo dos sonhos, da fantasia e da imaginação (escapismo, evasão);
  • desilusão adolescente;
  • idealização do amor e da mulher;
  • subjetivismo, egocentrismo;
  • saudosismo (saudade da infância e do passado);
  • gosto pelo noturno;
  • consciência de solidão;
  • a morte: fuga total e definitiva da vida, solução para os sofrimentos;
  • sarcasmo, ironia.








Em 12 e Setembro de 1831, nascia em São Paulo, Manuel Antônio Álvares de Azevedo. Filho de Inácio Manuel Álvares de Azevedo e Maria Luiza Mota Azevedo, o poeta, contista e ensaísta Álvares de Azevedo, teria nascido na sala da biblioteca da Faculdade de Direito de São Paulo; porém, foi constatado que o nascimento se deu na casa do avô paterno, Severo Mota.

Filho de família ilustre, mudou-se para o Rio de Janeiro em 1833, e em 1840 ingressou no Colégio Stoll; retornando a São Paulo em 1844. Regressou para o Rio de Janeiro no ano seguinte e matriculou-se no Colégio Pedro II. Finalmente, em 1848 entrou para a Faculdade de Direito de São Paulo. Tendo uma vida literária intensa, Álvares de Azevedo foi fundador da Revista Mensal da Sociedade Ensaio Filosófico Paulistano.

Fortemente influenciado por Lord Byron e Musset, Álvares de Azevedo inseriu em suas poesias elementos da linguagem desses escritores. A melancolia e a presença constante da morte eram temas perenes em suas obras.

Álvares de Azevedo era de pouca vitalidade e o desconforto das repúblicas aliado ao esforço intelectual intenso, enfraqueciam sua saúde. Entre 1851 e 1852, manifestou-se a tuberculose pulmonar, agravado por uma lesão ocasionada numa queda de cavalo ocorrida no mês anterior. Sofreu uma intervenção cirúrgica que não surtiu efeito, e faleceu às 17 horas no dia 25 de Abril de 1852. Seu corpo foi enterrado no cemitério Pedro II, na Praia Vermelha; em 1854, foi transladado para o cemitério São João Batista.

Se eu morresse amanhã foi escrita dias antes de sua morte e lida no enterro por Joaquim Manuel Macedo. Álvares de Azevedo era amigo de Bernardo Guimarães, Aureliano Lessa e José Bonifácio; com que dividiu as acomodações da Chácara dos Ingleses, em São Paulo.

Entre 1848 e 1851, publicou alguns poemas, artigos e discursos. Depois da sua morte surgiram as Poesias (1853 e 1855), cujas edições sucessivas uniram-se aos outros escritos, alguns dos quais publicados antes em separado. As obras completas, como as conhecemos hoje, compreendem: Lira dos vinte anos, Poesias diversas, O poema do frade e O conde Lopo, poemas narrativos; Macário, "tentativa dramática"; Noite na taverna, contos fantásticos; a terceira parte do romance O livro de Fra Gondicário; os estudos críticos sobre Literatura e civilização em Portugal, Lucano, George Sand, Jacques Rolla, além de artigos, discursos e 69 cartas.

Preparada para integrar As três liras, projeto de livro conjunto de Álvares de Azevedo, Aureliano Lessa e Bernardo Guimarães, a Lira dos vinte anos é a única obra de Álvares de Azevedo cuja edição foi preparada pelo poeta. Vários poemas foram acrescentados depois da primeira edição (póstuma), à medida que iam sendo descobertos.

A característica intrigante de sua obra reside na articulação consciente de um projeto literário baseado na contradição, talvez a contradição que ele próprio sentisse, na condição de adolescente.

Perfeitamente enquadrada nos dualismos que caracterizam a linguagem romântica, essa contradição é visível nas partes que formam sua obra principal, Lira dos Vinte Anos. A primeira e a terceira partes da obra mostram um Álvares adolescente, casto, sentimental e ingênuo. Já a segunda parte apresenta uma face irreverente, irônica, macabra e por vezes orgíaca e degradada de um moço-velho, isto é, um jovem em conflito com a realidade, tragado pelos vícios e amadurecido precocemente.

A obra de Álvares de Azevedo apresenta linguagem inconfundível, em cujo vocabulário são constantes as palavras que expressam seus estados de espírito, a fuga do poeta da realidade, sua busca incessante pelo amor, a procura pela vida boêmia, o vício, a morte, a palidez, a noite, a mulher... Em Lembranças de morrer, está o melhor retrato dos sentimentos que envolvem sua vida: "Descansem o meu leito solitário/ Na floresta dos homens esquecida/ À sombra de uma cruz e escrevam nela:/ - Foi poeta, sonhou e amou na vida."

Um comentário:

Cecília disse...

Oi ^^
nem sei se ainda entra no blog, am enfim, gostaria de agradecer. Pois estou fazendo um trabalho que envolvia uam questão sobre uam crítica de algum blog de literatura, é dificil encontrar algum decente hoje em dia ¬¬ xDauhauha, demorei, mas finalmente encontrei o seu!(que sorte,fã do mal-do-século)e poder fazer uma associação: literatura e arte (música) foi perfeito, nem tinha pensado nisso ^^°...enfim, gostaria só de agradecer pela ajuda (inconsciente)e parabenizar pelo ótimo blog!